A EVOLUÇÃO IN VITRO DA CABEÇA DESPENSAMENTADA

Ricardo França de Gusmão

14.6.2021

Havia uma cabeça sem pensamento

sobre a cômoda.

A cabeça não tinha nome, era anônima.

O pensamento da cabeça oca

era uma coisa platônica.

.

Fatos contemporâneos orquestrados

continham uma explosão atômica,

enquanto o corpo, sua unidade anatômica

era estudado por acadêmicos

de Medicina.

.

Era um coco pós-sugado

por meio de um canudinho de plástico

na areia da praia poluidamente jogado

até que células tronco semi-humanas

de plástico

recompuseram o cérebro

no cocoruto

.

Apareceram incógnitas no microscópio

Digital sinais de inteligência impaciente

De uma espécie animal igual ao animal

Que macaqueia na gente

Um desvio não registrado no caderno

De Darwin

Uma espécie de Plano B

Da seleção natural da natureza

.

Acadêmicos de medicina supervisionados

Passaram a alimentar as primeiras células

Naquela colônia, um conglomerado

Com sessões de áudio-livros

Além de exibições de filmes

De cinema de povos bárbaros

.

E cresceu barba no cérebro em reconstrução

De depois surgiram raízes cerebrais

Que jazia de molho num tanque de vidro

Um cérebro hidropônico

Com sistema central e periférico

Ainda em estágio vegetal

Aos poucos em formação animal

Monitorado

.

Um dia o crânio já com membros

Em hegemonia lacônica

E olhos por todos os lados

Exigia

A euforia da carne

E ao seu tanque foram mergulhados

Ratos de laboratório

Brancos

E aquele sistema nervoso abriu-se em boca

De unanimidade

Para mastigar a opinião pública

Que exigia fome

De ratos

.

Um teste de QI, meses depois,

Apontou aumento de inteligência

E o ser pesquisado passou a ser

mais ágil do que a paciência metodológica

Daquela experiência

Do pós-necrológico

Neo-humano de reprodução

Assexuada

E da noite para o dia no tanque

Surgiram espécies de águas marinhas

Mas eram sêmen

Ou de gente, a vitamina

.

Um ano se passou e, de repente,

Havia uma criatura fora do tanque

E outras minis penduradas

Nos equipamentos do laboratório.

Um cheiro de acetona com azeitona

Mais tarde fora compreendida como

Feromônio

Gastro intestinal sexual

Casual.

A criatura carregava em uma das patas

Um caderno manuscrito

Com idiomas lunares

E uma gosma

De qualquer coisa semelhante

A mandíbula pingava nele.

.

o corpo de um cientista e de oito

estudantes

foram encontrados mastigados

no plantão seguinte

e no chão a tampa do ralo

do esgoto

arrancada apontava

a rota da fuga.

.

.

E até hoje essa criatura

Aparece em meus sonhos

Em noite de lua

Me assusta

E me perturba.

Ela é o mito que flutua

Pelos ares

Nos céus dos meus versos

Poemas às centenas

E agrava meus enfisemas

Pulmonares.

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>>> Jornalista, professor e poeta, Ricardo França de Gusmão, 54 anos, é detentor de vários prêmios literários. Conquistou três prêmios de reportagens sobre Direitos Humanos, dois internacionais, e um de dimensão nacional, na condição de repórter especial e professor orientador universitário. Trabalhou na imprensa escrita, TVs, assessorias de imprensa, internet e Academia. Publicou 27 livros de poesia, contos e crônicas.

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