CRÔNICA POÉTICA DO ROMANCE TARIFADO
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- 14 de dez. de 2022
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Atualizado: 15 de dez. de 2022

CRÔNICA POÉTICA DO ROMANCE TARIFADO
Por Ricardo França de Gusmão
Vaz Lobo, 4.1.2008
O Governo Federal acredita que os romances
Crescerão este ano 23,2% a mais em relação
Ao ano passado.
Então, para substituir a CPMF o presidente
teve a idéia de criar o romance tarifado
que mexerá com o bolso dos brasileiros
apaixonados.
De acordo com o IBGE a classe média namora mais
E, portanto, será a mais atingida pela nova medida.
A oposição disse que isso não se faz
E que não vai apoiar a iniciativa.
Os especialistas da Fazenda atingiram em cheio
A população dos homens de coração mole
E as mulheres de coração puro.
A pessoa física que sente também
Sofrerá mais do que a pessoa jurídica
Que não ama ninguém.
Enquanto o pobre ‘fica’ no baile e beija na praça
o rico articula o romance-que-finge-que-ama e casa
para solidificar o sobrenome do clã.
O casamento é investimento que renderá
no câmbio paralelo amanhã.
O milionário sonegará 10% dos beijos tarifados
E os transformará em dividendos bancários
Ao contrário dos apaixonados-honestos-&-otários
Que declaram 100% do seu amor ao Fisco.
A pessoa física que tiver amante terá que desembolsar
0,34% a mais por conta do fator risco.
Foi mantida a alíquota zero
Para amor de avó, de mãe, de pai,
de filho legítimo e de Jesus.
A cota que incidirá sobre os romances
Deve afetar ainda livros de amor,
Filmes de paixões impossíveis,
Cartas declaratórias pelos Correios,
Noites de Lua de mel,
E beijos despropositados no pescoço.
As operações de crédito das agências
Especializadas em encontros
E as cooperativas de solteiros arrependidos
Sofrerão altas e desencontros
E prejuízos.
O setor financeiro desta vez foi atingido
E os banqueiros que amam dinheiro
Terão que pagar pelo lucro líquido.
De acordo com o Banco Central,
É uma contrapartida social.
A Lei do Governo Federal
Já está sendo chamada de “Ninguém ama ninguém”
E pode aumentar os rendimentos dos fundos
De pensão
De quem ama por interesse.
A Receita Federal vai fiscalizar contas conjuntas.
Pessoas que andam de mãos dadas
Terão que responder perguntas,
E as camas de casal vão ser monitoradas
Com um sistema inédito de chip
- implantado nelas no ato das vendas -
E ativado sempre depois das noitadas.
Segundo os especialistas
A sonegação vai aumentar
E grande parte dos apaixonados
Deve cair na clandestinidade,
Aumentando a prática do romance informal.
Aquela coisa de sair sem dizer
Que está amando,
De ficar e deixar o tempo ir passando
E coisa e tal.
A Igreja prevê queda no índice de casamentos
E programa uma reação junto aos religiosos
Mais ortodoxos
A ofensiva conta com apoio dos espíritas,
Dos umbandistas e dos agnósticos.
O tributo foi considerado bruto
Até pelo presidente George W.Bush
Que, em retaliação, anunciou que vai assinar
O Protocolo de Quioto e decretar luto
Capitalista naquela região.
(Mas ele continua sendo um bobalhão!)
O presidente da República Federalista do Brasil
Ante a um país sem romance
Esboçou um sorriso no canto da boca vil
E disse que não há nenhuma chance
De abdicar do imposto,
E criticou a desobediência civil.
Afirmou que dará o exemplo amando
A sua esposa agora muito mais do que antes
Pois o seu amor à Nação merece incentivo fiscal
Esforço acima de tudo pessoal
E chamou a comoção nacional de hilariante.
A partir de manhã o romance fica mais salgado
Do Oiapoque ao Chuí.
Curtir um lance internacional
Será menos oneroso do que aqui.
Mas enquanto esse imposto durar,
de qualquer maneira,
não há como deixar de amar.
O brasileiro gosta de beijar
na rua, na praia, no mar,
sob a sombra da amendoeira,
nos esconderijos dos namorados foragidos
dos doces romances clandestinos
dessa Nação inteira.
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