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O IDIOTA QUE DANÇOU A VALSA

Foto do escritor: AdminAdmin

O IDIOTA QUE DANÇOU A VALSA

Ricardo França de Gusmão

27.12.2022


Eu fui um idiota.

E dancei valsa com a política.

Mas era Heavy metal

E não era vitrola, mas MP3, pós DVD.

Eu era de vinil e o apocalipse

Bebia petróleo sob meus pés

Enquanto gente empobrecida apodrecia

Durante minhas orações a Nossa Senhora Aparecida.

A minha caneta de jornalista

Era de assessor e de mentira

E mentirosa

Nas notas que escrevia

A hipocrisia

Era um mar de rosas

Enquanto a polícia exterminava

Minha narrativa absolvia e amenizava

Enquanto a política saqueava

O Rio de Janeiro

Meu chefe ganhava 20 mil dinheiros

Para ficar em casa

A imprensa repetia

O que a subchefe falava

.

As comunidades incendiavam ônibus,

Pneus

Interditavam vias

E enterravam adolescentes

Enquanto eu pensava

Que dançava valsa

Com a justiça

Ela passou a cheirar carniça

E me vi a dançar

Com a corrupção

Em prosperidade financeira

Masturbada,

Ao ver o governador ser preso

na televisão,

e depois seu sucessor ser preso

reprise do primeiro ladrão

e antes dele, outro antes dele

até que fiquei só

no salão.

.

Arranquei as amarras

Que me marionetavam.

Fotografei bilhetes confidenciais

Anormais

Fui perseguido.

Como um herói-bandido

Perdi o distintivo, a minha

Arma-caneta e bloco:

“Cala a boca, porra!”

Não calei a boca.

Porra.

Pensei que a alternativa

Seria a assembleia legislativa

E alimentei a segunda cabeça do bode

Fedido,

Com informações posteriormente

Negociadas

Em troca de favores

E silêncios entre partidos

De oposição.

Eu era idiota.

.

O idiota ideal pois ideológico

Estava cego.

E a cegueira de imaginar pertencer

Ou ter sido pertencido

Pelo lado certo

Me transformou num boneco

De papel.

.

E comi no prato deles.

E recebi o salário que eles

Me pagaram.

E defendi tanta irrealidade acreditada

Que cheguei a perder amigos, colegas,

Conhecidos, estranhos, inimigos.

Um dia cheguei a acreditar

Que era nobre ter inimigos

Pois eu estava do lado certo.

Então os canalhas

— corpos estranhos ao meu sistema vascular

De valores e crenças —

Valorizavam a minha estirpe por serem

Minha negação. Eu era um diamante de carvão

Que brilhava na escuridão.

Eu era idiota.

Eu era míope.

Meu cérebro incapaz, medíocre,

Obedecia à guilhotina

Do meu coração.

.

Após boxear com o sistema

Monitorei a previsão do tempo

E mergulhei na primeira chuva.

Para tirar o fedor do corpo

Ao fim da minha luta.

Mantenho-me vivo

Ao fazer transfusão de sangue

Com a poesia,

Termômetro da minha valentia

Reconectada.

Ontem eu fui um idiota.

Hoje guardo essa medalha.

A desobediência civil do idiota

É a lâmina de uma navalha.





 
 
 

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