
RÉVEILLON: MUDANÇA DE MENTALIDADE
Ricardo França de Gusmão
27.12.2022
.
A quatro dias do réveillon que anuncia
2023
Os leitos batem recorde de ocupação
Para receber o espírito do ano vindouro.
Turistas de todos os estados brasileiros
E estrangeiros
Acreditantes de magia e pirotecnia
Reservaram suas vagas
Ao arrefecer da pandemia
Ainda respirante
Invisível elefante
De planetária cidadania.
.
Na fila de espera dos transplantes
Da mais medicinal tecnologia
Pessoas que desejam mudar de vida
Acampam nas calçadas dos hospitais
De alta complexidade
Cirúrgica humana
Localizados ao longo do perímetro
Da praia de Copacabana
.
Em comum, todos querem esquecer
O passado e, principalmente,
O presente
E decidiram que, fazer transplante
De cérebro
Era a receita mais conveniente.
Uma vitória da ciência
Contra a mandinga,
A magia, a feitiçaria,
Os despachos, orações,
Os antigos métodos e bordões
Cânticos afros e cristãos
.
A busca de cérebros novos
Sem memórias encardidas
E ostras incrustradas
De recordações sublimadas
E lembranças arriscadas
Era um problema filosófico-hospitalar-existencial
Com tendências a transtornos psiquiátricos
E, ademais, coisas grudadas
E não biodegradáveis traumas ancestrais
Dentre outros efeitos colaterais
.
Mas onde encontrar cérebros novos?
Órgãos neurais com HDs cerebrais disponíveis
A novas experiências que já não são mais possíveis?
Sistemas nervosos centrais e periféricos
Que desconheçam as noções do quente e do frio,
Os nomes das cores, os sonhos, os desejos
E os medos mais primitivos?
.
Então eis que surgiu no mercado
Internacional
A tal da inteligência neural
Artificial
Coisa chique:
Um chip.
Um recomeço, um reinício
De silício
Tão aperfeiçoados que até por wi-fi
Podem exercer o pensamento
Porém monitorado
.
O restante da caixa craniana seria revestida
Com algodão iônico e isopor hidropônico
A prova de impacto acidental, cabeçada
Na parede
Amortecedores climatizados
360 graus
.
O réveillon de 2023 seria filmado ao vivo
E retransmitido
Pelas complexas vias aéreas Alexas.
Após a alta hospitalar,
Dessas pessoas, então, mais felizes
Comparadas
A seus pares de espécie com cérebros
Analógicos pensativos em monólogos,
Memória, sonhos e pesadelos
Em VHS, imagens envelhecidas
E horríveis,
Estariam, pois, em vantagem competitiva
Quanto a inteligência emocional.
A cada ano novo
Haveria menos povo
A pelejar pelas areias e pegadar
Pela branca tez, macia e cortez
Da nossa linda ‘Princesinha do Mar’,
Cenário natureza das sereias e das ninfas.
.
E assim, de forma gradativa,
As coincidências pesadas e mal dormidas
Vão ficando livre das culpas,
Mais leves e limpas.
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